Pescadores de praias atingidas por óleo relatam queda de até 80% nas vendas
O barco de Anderson Carvalho, 22, está encostado na areia da em Jacuípe (40 km de Salvador), no trecho em que o rio encontra o mar. Não saiu do lugar nos últimos 20 dias, desde que as primeiras manchas de óleo começaram a chegar à região.
Ele aproveitou o momento ruim para fazer a manutenção do seu barco e das redes de pesca.
“O pescador não vai para ao mar porque não vale a pena. De que adianta ter custos com o combustível, com auxiliares, com manutenção para voltar e ficar com o peixe enfurnado na geladeira?”, questiona.
Anderson afirma que os pescadores artesanais da região tiveram uma queda de até 80% nas vendas desde a chegada do óleo. O panorama é o mesmo para cerca de 43 mil pescadores de cidades do litoral da Bahia atingidas pelo vazamento.
Em Jacuípe, o vaivém dos pescadores durante o início das manhãs deu lugar um cenário modorrento, em que quase nenhum barco está no rio ou no mar. Os pescadores reclamam da falta de apoio do poder público e, sobretudo, da disseminação da informação de que o todo o pescado da região está contaminado.
Um estudo da Universidade Federal da Bahia analisou 50 animais marinhos e identificou a presença de óleo em todos eles. Os pesquisadores, contudo, evitam falar em contaminação, que só poderá ser identificada em uma segunda etapa do estudo, que vai verificar a existência de metais pesados no pescado.
O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento tem afirmado que não há contaminação do pescado nas áreas atingidas pelo óleo.
“As áreas e os pescados estão sãos. Nós não tivemos nenhuma notificação de contaminação”, afirmou o secretário nacional da Pesca, Jorge Seif Júnior, em um vídeo publicado na quarta-feira (30) em uma rede social.
Na praia da Espera, em Itacimirim (a 50 km de Salvador), parte dos pescadores já retomou o trabalho, mas ainda há reclamações sobre a baixa procura.
Na quarta-feira (30), o pescador Genildo dos Santos, 33, voltou do mar com um isopor com cerca de uma dúzia peixes, mas sem esperança de vendê-los: tudo irá para o consumo dele e da família.
“Ninguém quer comprar porque está todo mundo dizendo que o nosso peixe está contaminado, mas eu sempre digo que não está. Não teve nenhum peixe morto aqui na praia”, diz Genildo.
Juarez Rodrigues dos Santos, 34, tem o mesmo discurso na ponta da língua: diz que os pescadores da região vão pescar a cerca de sete quilômetros da costa e que não há risco de contaminação para quem consumir os peixes.
Pescador em tempo integral, ele reconhece que houve uma redução nas vendas do pescado e diz que a renda familiar caiu abruptamente.
“Nós precisamos cuidar da família. Temos filhos que precisam de alimento, de remédio, temos que pagar nossas contas”, diz o pescador.
Na última semana, o governo federal estendeu o pagamento de seguro defeso para cerca de 60 mil pescadores das cidades atingidas pelo óleo. Na terça-feira (29), ampliou o pagamento a pescadores de camarão e de lagosta.
Nos dois casos, o prazo do benefício, que é concedido a pescadores no período de proibição da pesca comercial, foi estendido até o final do ano. Em condições normais, ele é pago de três a cinco meses por ano, dependendo da área de pesca e da espécie do pescado.
Cada pescador beneficiado receberá dois pagamentos extras, um em novembro e outro em dezembro, no valor de um salário mínimo: R$ 998.
A extensão do benefício, contudo, não chegou a marisqueiros e catadores de siris e caranguejos. O governo afirma que está estudando uma ampliação do benefício para esses profissionais. De acordo com levantamento da Folha, pelo menos 144 mil pescadores e marisqueiros podem ser prejudicados.
Com o barco fincado na areia na praia de Jacuípe, Anderson Carvalho se encosta no balcão na barraca onde vende bebidas e petiscos no fim de semana, mas cujo movimento caiu nas últimas semanas.
Abre uma garrafa de cerveja para si e lamenta: “Não tem muito a fazer não. Estamos aí, na mão de Deus e na boca do povo”