Praias e bares de Salvador enfrentam problemas com caixas de som; legislação não é respeitada
O limite sonoro permitido em Salvador é de 70 decibéis, das 7h às 22 horas
Em Salvador, quem vai à praia tem dificuldade para escutar o barulho do mar. Elas podem ser do tamanho de seu bolso ou até mesmo uma mala com rodinhas: as caixas de som definitivamente vão te incomodar.
O instrutor de Zumba, Henrique Pereira, 46 anos, conta que já passou por diversos embaraços. “Nas últimas vezes que estive no Porto da Barra para observar o pôr do sol, me incomodou muito a qualidade do som. Não é o tipo de música, mas a qualidade mesmo. Parece que todas estão ligadas em uma rádio AM de baixíssima qualidade, o som fica estridente. É um som fritando”, diz.
“No último feriado eu estive com minha família na praia e atrás da nossa mesa tinha uma galera com duas caixas de som, das grandes, de alça JBL Xtreme, conectadas uma com a outra, e estavam num volume que me fez sentir dentro de uma balada. Não consegui conversar com as pessoas na minha mesa sem ter que gritar. Fomos embora mais cedo por causa disso”, desabafa Henrique.
O responsável de produção automotiva, Antônio Santos, 28 anos, conta que prefere sair de Sussuarana, onde mora, para a Praia do Flamengo, justamente para fugir do barulho de Itapuã, Barra e Piatã. “É normal colocarem as temidas caixinhas de som, até mesmo em locais em que já se tem o som ao vivo, fazendo até ‘guerras’ de qual é mais alta e toca o melhor som. Infelizmente ficamos reféns, sem ter o que fazer, a não ser se retirar do local”, lamenta.
O som alto nas praias é, na verdade, uma realidade em todo o país. Do Funk “proibidão” ao Sertanejo Universitário, passando pelo Axé à música eletrônica, diversas cidades estão criando legislação própria para coibir o barulho.
Um dos locais turísticos mais famosos do país, a cidade de Balneário Camburiú, em Santa Catarina, proibiu o uso de caixas de som de qualquer tamanho em locais públicos da cidade. Na cidade de Anchieta, no Espírito Santo, esses equipamentos sonoros não podem ser levados para as praias. Quem descumprir, pode ser multado em até R$ 1.950.
Uma lei mais antiga, de 81 anos, já pregava contra o abuso à ordem pública. O Artigo 42 do Decreto Lei nº 3.688, de 3 de outubro de 1941, já deixa claro que “perturbar alguém, o trabalho ou o sossego alheios abusando de instrumentos sonoros ou sinais acústicos” é crime com pena de prisão simples, de quinze dias a três meses, ou multa, de duzentos mil réis a dois contos de réis. A moeda brasileira já mudou para real e o mau hábito do barulho frenquente não foi coibido.
Salvador segue a Lei Municipal nº 5.354, de 28 de janeiro de 1998. Ela determina os níveis aceitos de decibéis (db): 70 db (7h às 22h) e 60 db (22h às 7h).
As caixinhas de som disponíveis no mercado geralmente medem entre 30 db e 130 db, podendo ultrapassar em muito o limite permitido. Segundo a Secretaria Municipal de Desenvolvimento e Urbanismo (Sedur), desde 1° de janeiro de 2022 até o último domingo, 17 de abril, 13.699 chamadas foram feitas por reclamação de som alto.
Neste período, 767 equipamentos sonoros foram apreendidos. Os bairros com mais denúncias são Itapuã, Pernambués, Rio Vermelho e Paripe. Ainda de acordo com o relatório da secretaria, carros particulares lideram a lista de denúncias, seguidos por restaurantes e boates. As residências aparecem em terceiro lugar.
Legislação
A advogada Carolina Curi explica que o excesso de barulho, para além de uma questão puramente de saúde, é também questão de ordem pública.
“Acredito que toda essa regulamentação seja pelo fato de que a poluição sonora acabou por transformar-se num grave problema de saúde pública e segurança no Brasil. Em muitos casos, o bom senso deixou de prevalecer e muitas pessoas exorbitam os limites da razoabilidade e respeito ao próximo criando conflitos. O exemplo clássico da atualidade é o uso das caixinhas de som bluetooth que são facilmente carregadas para todos os lugares e com capacidade de decibéis suscetível de causar incômodo e poluição sonora em qualquer lugar”.
Ainda segundo Curi, “desde os regramentos no âmbito federal, diversos estados e municípios vêm adotando leis próprias com a finalidade de coibir / educar a população quanto à poluição sonora”.
No estado da Bahia, por exemplo, podemos citar a lei estadual número 12.803/13 que dispõe sobre o uso de aparelhos sonoros ou musicais no interior dos transportes coletivos intermunicipais.
Em 2022 faz dez anos da aprovação do Projeto de Lei que proíbe o som em ônibus da capital baiana. Criado pela vereadora Andrea Mendonça (PV) o Projeto tinha a co-autoria do vereador Isnard Araújo (PR). Segundo Andrea, ela resolveu propor o PL depois de receber apelos da população.
À época já existia a dúvida: como a Superintendência de Controle e Ordenamento do Uso do Solo (Sucom) vai fazer para cumprir a Lei? Dez anos depois, procurada pelo Jornal da Metropole, a Sedur afirma que não possui dados de ações envolvendo a violação dos decibéis permitidos nos ônibus de Salvador.
Enquanto a lei dos ônibus não é cumprida, quem sofre nas praias pede uma ação emergencial.
“Acho que está fora de controle. O que estamos vendo nas praias de Salvador são quatro ou cinco caixas de som ligadas ao mesmo tempo em volume alto e você não consegue conversar e nem ouvir nenhuma das músicas. Penso que não deveria ter uma regulamentação em cima das caixas, mas sim a proibição com fiscalização principalmente em locais turísticos”, opina Henrique.